Preço das casas à venda a subir? “É cada vez mais difícil construir” Em entrevista, os partners da Invicta Park explicam as principais dificuldades de construir casas, começando pela mão de obra. 22 mai 2025 min de leitura A vontade de construir casas em Portugal existe por parte dos promotores imobiliários. Mas são muitos os desafios que hoje enfrentam, desde a falta de mão de obra aos altos impostos e burocracias, o que acaba por travar projetos, sobretudo, de habitação acessível. “Cada vez é mais difícil construir. As nossas gerações mais antigas produziam mais rápido e melhor. (…) O que se fazia num dia, agora demora dois ou três. E isso está refletido no custo da construção, que aumentou”, explicam António Machado e Georgi ZacZac, partners da promotora Invicta Park, em entrevista ao idealista/news. Numa altura em que a crise no acesso à habitação é gritante, a Invicta Park construiu cerca de 200 casas nos últimos dois anos, todas no Norte do país. “Temos habitação de luxo e à volta de 80 apartamentos destinados à classe média em dois empreendimentos, o The Park de Madalena e o The Park Canelas”, detalha António Machado, adiantando, no entanto, que não está nos planos da promotora imobiliária construir habitação acessível, “porque as contas não fecham”. “Hoje, não há um investidor que consiga produzir casas acessíveis”, frisa. Para Georgi ZacZac, “a única maneira de resolver esse problema é construir para cima, construir em altura”, porque a construção acaba por sair mais barata e não ocupa tanto espaço. Além disso, independentemente do novo Governo que venha a sair das eleições legislativas de 18 de maio de 2025, “a única coisa que nós, promotores, gostaríamos de ter são regras muito claras”, refere ainda o empresário brasileiro. Assim, a construção em altura, a clarificação das leis e a agilização das burocracias são três aspetos que os partners da Invicta Park consideram importantes para tornar a construção de casas mais atrativa e barata - e consequentemente aumentar a oferta de habitação e baixar os preços - segundo explicam em entrevista conjunta ao idealista/news para ler em seguida. Créditos: Invicta Park A Invicta Park define-se como uma “casa de investimento alternativo”. O que é que isto quer dizer? Georgi Zac Zac [GZ]: O investimento alternativo é fora do comum, fora do padrão. Não se trata de comprar um terreno e construir. Trata-se de identificar um edifício e conseguir convertê-lo, dar uma nova vida a algo que já existiu, uma alternativa. Qual é o vosso papel no mercado imobiliário? Procuram mais reabilitação ou construção nova? António Machado [AM]: Fazemos as duas coisas. Por vezes gostamos mais da reabilitação, porque é mais rápida em termos de licenciamento, mas também depende da oportunidade, da procura que existe no imobiliário e da logística. Quando se reabilita um edifício, também há a vantagem de não consumir tanto aço, contribuindo para a sustentabilidade do planeta. Depois, também temos obra nova, em que compramos o terreno e tratamos do licenciamento. "Em Portugal, algo que muitas vezes desmotiva o investidor é a burocracia", António Machado, partner na Invicta Park Diversificar investimentos em habitação, logística e hotelaria é uma estratégia vencedora? Porquê? Concentram a vossa atividade imobiliária no Norte ou também noutras zonas do país? GZ: Porque em Portugal é possível fazer isso. É possível percorrer o país de uma ponta à outra em 6-7 horas. Se nos focássemos só num ativo, estaríamos a deixar de participar em outros que estão ali ao lado. Na verdade, o nosso foco tem sido sempre o Norte e pretendemos continuar por aqui. Cada negócio é específico. Estamos sempre à procura do melhor retorno dentro destas especificidades. AM: Todos segmentos do imobiliário são bons negócios, desde um prédio residencial e um ativo logístico. Agora depende da oportunidade, da localização e do tempo de construção. Em Portugal, algo que muitas vezes desmotiva o investidor é a burocracia. Por isso, ter um projeto já aprovado é uma coisa e ter um terreno para construir que precisa de projeto de arquitetura e licenciamento é outra. Tudo o que é tempo para nós é fundamental, fazendo-nos decidir por um projeto face a outro. Arthouse Boavista, PortoCréditos: Invicta Park Foi o fator tempo que pesou na decisão de transformar a antiga sede do BPI no Porto no Arthouse Boavista? Porque decidiram optar pela habitação ao invés de outro segmento? AM: A localização, por ser prime. Este prédio podia ter vários usos. Na altura, foi-nos logo apresentado um projeto para serviços, dando continuidade ao que existia. Mas quisemos apostar num projeto diferenciado, uma vez que se localiza numa zona residencial de luxo. Como está o desenvolvimento do Arthouse Boavista e qual o investimento associado? Quantas casas já têm vendidas? O que procuram estas famílias nestas casas de luxo? GZ: É um projeto que tem sido bem-sucedido, tem tido uma ótima procura. E é inovador por ter vários serviços associados, várias ‘amenities’. É o primeiro prédio no Porto que vai ter um 'concierge'. Vai ter segurança 24 horas. É um prédio dedicado às artes, sendo que a ideia do edifício Arthouse dar a sensação de que as famílias moram numa galeria de arte. E essas inovações geraram muita curiosidade. Em termos de vendas, tem sido um sucesso. Quem procura estas casas, muitas vezes já sabia que estas ‘amenities’ existiam noutros lugares do mundo, mas não aqui. E a partir do momento em que este tipo de serviços aparecem, identificam-se. "Nestes últimos dois anos, estamos com cerca de 200 casas, todas aqui no Norte", António Machado, partner na Invicta Park Outro projeto é a reabilitação do antigo prédio da agência do BPI, na Rua de Sá da Bandeira do Porto. Vai nascer aqui uma unidade hoteleira de luxo? Fale-nos sobre este projeto. AM: Será um edifício para turismo, sem dúvida, para um hotel, mas ainda está na fase de licenciamento. E, entretanto, avançamos com um Pedido de Informação Prévia (PIP), como é público. Agora, a seguir ao PIP, estará na fase de entrar o projeto de arquitetura. GZ: Quanto ao investimento, ainda não sabemos, porque podemos fazer um hotel de duas estrelas ou um de cinco estrelas. Quantas casas vão colocar no mercado nos próximos anos? E para que segmentos? AM: Nestes últimos dois anos, estamos com cerca de 200 casas, todas aqui no Norte. Temos habitação de luxo e à volta de 80 apartamentos destinados à classe média em dois empreendimentos, o The Park de Madalena e o The Park Canelas. Créditos: Invicta Park Investir em habitação acessível está nos vossos planos? Porquê? AM: Não, não está, porque as contas não fecham, perante o custo do terreno e o custo de construção. Hoje, não há um investidor que consiga produzir casas acessíveis. Teria de haver um grande incentivo, ao nível do custo de construção, tempo de produção, IVA e outros impostos. Teria de se mexer numa destas variáveis. Ninguém consegue produzir aos preços que são, no fundo, estabelecidos pelo Estado. Como é que se pode incentivar a construção de casas acessíveis? GZ: Acho que é relativamente simples esse problema: deixem construir em altura. Entendo que haja leis da arquitetura que têm de ser respeitadas. Mas, ao mesmo tempo, nada prevê que se faça uma designação de uma área específica em cada município ou cidade e que se deixe construir em altura, porque é a única maneira de se resolver esse problema é construir para cima. AM: As cidades atualmente têm de ser pensadas, definindo-se uma área em que se pode construir torres. O que é que permite a construção em altura? Permite construir muito mais barato, não ocupa tanto espaço e, depois, há também outro tipo de serviços que podem estar nessas torres, que podem ser híbridas, tendo habitação e serviços. E vai-se desocupar os prédios de serviços que não fazem sentido estar nas cidades, nos centros. "A única maneira de resolver o problema é construir para cima", Georgi ZacZac, partner na Invicta Park Quais são os principais desafios da construção atualmente? A falta de mão de obra é um problema? AM: Cada vez é mais difícil construir. As nossas gerações mais antigas produziam mais rápido e melhor, porque agora os jovens não querem ir para a construção. Os europeus não querem trabalhar na construção. Portugal ainda tem um bocadinho da mão de obra antiga, mas cada vez tem menos. Por exemplo, se antes um pintor pintava 20 metros quadrados por dia, agora um novo pintor só pinta cinco. A mão de obra é cada vez mais lenta e mais fraca. Por isso é que é mais difícil construir, ou seja, o que se fazia num dia, agora demora dois ou três. E isso está refletido no custo da construção, que aumentou. É por isso que esta é uma questão séria e tem de haver um critério bom no recrutamento da mão de obra. E só se resolve com a imigração das pessoas. Mas temos de ter em mente que não é com a qualidade que tínhamos. E para atingir aquela qualidade demora mais tempo. Como é que se pode resolver esta questão da qualidade da mão de obra? Haver mais formação especializada? AM: Sou a favor das escolas práticas, porque hoje um bom profissional bem formado, seja eletricista, picheleiro, serralheiro ou carpinteiro ganha mais que um professor ou que um enfermeiro. Mas uma empresa que vai recrutar, também não poderá pagar logo esse salário, porque não vai saber fazer. Prefiro contratar alguém com formação e experiência. Tem de se olhar para isso como um caso sério e apostar nas escolas. As escolas têm de se direcionar para formar profissionais e dar-lhes alguma experiência antes de chegarem ao mercado de trabalho. Freepik Têm sentido maior procura de casas por jovens com o IMT Jovem e garantia pública? AM: Sim, ajudam-nos um pouco nos empreendimentos de classe média. A isenção do IMT é um incentivo. Era bom que se conseguisse reduzir o IVA para 6%, porque é um custo não é dedutível. Enquanto nas outras atividades, o IVA é sempre dedutível, a promoção imobiliária não, é um custo. Ou seja, se uma casa custa um milhão de euros, tem de se acrescentar mais 23%, passando logo para 1 milhão e 230 mil euros. Depois, há que somar o IMT da compra do terreno. Tudo isto vai acrescentar ao custo da fração. Quem é que compra as vossas casas? Mais a portugueses ou estrangeiros? E como está a procura internacional com menos incentivos fiscais? AM: Temos muitas famílias a comprar segundas habitações. Temos estrangeiros a comprar, muitos brasileiros a adquirir casas para a classe média. E, depois, temos também os jovens, principalmente aqueles que trabalham em informática e nas engenharias. Nota-se muito esse tipo de clientes. "As pessoas vão ao stand de vendas e dizem que podem comprar casa por que juros estão mais baratos", Georgi ZacZac, partner na Invicta Park Que efeito está a ter a redução dos juros no vosso negócio, seja do lado da procura de quem quer comprar casa, seja no financiamento dos vossos projetos? GZ: A taxa de juro quanto mais baixa melhor. Por exemplo, sentimos uma procura crescente quando comparada com o lançamento do projeto há um ano e meio. As pessoas vão ao stand de vendas e dizem que podem comprar casa por que juros estão mais baratos. AM: Quanto ao financiamento dos projetos, é um alívio sim. Nós usamos capital próprio, captamos investimento estrangeiro (sobretudo vindo dos EUA e da Europa) e trabalhamos também com a banca local. A Invicta Park nunca foi uma empresa muito alavancada, tivemos sempre esse cuidado. Agora, as gerações mais novas têm ainda muita falta de literacia financeira. Hoje, as pessoas esquecem-se das crises rapidamente. Há dois ou três anos, quando as taxas Euribor estavam nos 0,7%-0,8% e as taxas fixas nos 1,4%, os portugueses continuavam a optar pela Euribor. Mas na França ou na Suíça, as taxas fixas representam cerca de 90% do crédito habitação. Os portugueses não têm essa sensibilidade, querem pagar sempre o mínimo, mas, depois, quando os juros disparam é um descalabro. A literacia financeira também se podia começar a incutir nas escolas, porque o mercado não sempre reto, há altos e baixos. E as empresas e as famílias não podem estar assim tão alavancadas. Freepik A atual instabilidade política cá dentro e a incerteza global estão a tocar o vosso negócio ? De que forma? AM: Nunca me preocupei com isso. Mas claro que temos de estar sempre atentos ao mercado. A verdade é que toda a vida foi assim, sempre houve guerras e crises. Todos sentimos as dores ao mesmo tempo e reage-se de forma dinâmica. O mundo cada vez é mais global e não me lembro de haver plena estabilidade. Se vai haver uma crise, vamos procurar a solução. Depois de o Trump ter anunciado as tarifas, a Europa e os outros países já reagiram e vão criar alternativas. E é assim que tem de ser, reagir de forma dinâmica e de nos adaptar. A nossa máxima é: se há um problema, qual é a solução? Com novas eleições legislativas à porta, o que é que o novo Governo poderá fazer para impulsionar a construção de casas em Portugal, nomeadamente para a classe média? AM: Deixar construir em altura e ser rápido nas burocracias. Temos 308 municípios e cada um tem as suas leis. Devia de haver leis mais generais e agilizar os procedimentos, porque o capital de um promotor não espera. Hoje, um promotor investe com uma expetativa, uma rentabilidade de 20% ou 30% prevista para dois anos, mas se demorar três ou quatro anos a rentabilidade já não será a mesma, e desiste do país. GZ: Quem é o Governo para nós não faz diferença nenhuma. A única coisa que nós, promotores, gostaríamos de ter são regras muito claras. "Esta para sair uma revisão ao simplex, mas isso não é bom para os empresários, que têm compromissos a fazer e contas a pagar", António Machado, partner na Invicta Park Como é que veem as recentes alterações ao simplex dos licenciamentos urbanísticos? GZ: Excecional, muito bom. AM: Influenciou o licenciamento e a reconversão do Arthouse. Antigamente, era impossível transformar um edifício de escritórios em habitação. Era um bicho de sete cabeças. Antes, tinha de haver unanimidade entre os condóminos para se fazer uma alteração, se um condómino não aceitasse, não se podia transformar. Não pode ser assim. Esta alteração cria dinâmica no mercado. Mas ainda falta clareza no simplex. Esta para sair uma revisão ao simplex, mas isso não é bom para os empresários, que têm compromissos a fazer e contas a pagar ao fim do mês. Devia haver prazos a cumprir e se não fossem cumpridos, os projetos deveriam ser aprovados. Não podemos estar à espera de decisões das instituições públicas. Os promotores imobiliários têm muitas vezes essas dores, que acabam por matar muitos projetos. As pessoas têm medo de decidir. Mas o pior que existe, é não tomar uma decisão, porque assim não se avança. Créditos: Invicta Park Quais são os vossos planos para o futuro? Alargar horizontes geográficos e de segmentos do imobiliário está em cima da mesa? Quanto é que planeiam investir, nomeadamente em habitação? AM: Estamos cada vez mais dinâmicos, cada vez a investir mais e vamos continuar a investir aqui. E também posso dizer que já temos um investimento em Lisboa. Estamos no Porto e no Norte, mas também em outras regiões. A ideia da Invicta Park é continuar a fazer três ou quatro projetos por ano. Já investimos mais de 100 milhões de euros, seguramente. GZ: Agora queremos fazer bons negócios, que façam sentido. Temos as nossas métricas e os negócios têm de estar dentro destas métricas e ter uma saída. Fazemos 'duo diligente' para entender o que se pode fazer. Sempre que entramos num negócio, sabemos qual é a sua saída, sabemos como é que o vamos concretizar, já sabemos se vai ser um prédio residencial, um projeto lógico, de serviços ou um hotel. Quanto ao investimento futuro, ainda não sabemos, porque podemos fazer um ou dez negócios. Somos muitos pragmáticos. Se não conseguimos resolver em meia hora, é porque não é um bom negócio. Fonte:Casas à venda mais caras? “É cada vez mais difícil construir” — idealista/news Partilhar artigo FacebookXPinterestWhatsAppCopiar link Link copiado